As descobertas do pré-sal podem representar uma nova era
na história brasileira. Diante dos volumes de reservas
já comprovados e do potencial ainda desconhecido, não
há dúvidas de que o Brasil terá
posição de destaque na indústria
petrolífera mundial, e sua materialização
poderá gerar consequências altamente benéficas
para o desenvolvimento industrial e econômico e para o
bem-estar social. Nesse contexto, o Estado brasileiro está
buscando rever o equilíbrio dos seus interesses com os dos
agentes econômicos privados através da
definição de um novo marco
jurídico-regulatório para os blocos do pré-sal
ainda não licitados.
É fato que o novo marco regulatório causou
diversas interpretações: por um lado, setores da
sociedade aprovaram a iniciativa, considerando-a um gesto firme (e
necessário) de aumento da participação do
Estado no pré-sal; por outro lado, outros setores entenderam
a proposta como um possível movimento inicial de
desestabilização regulatória do setor, que se
fundamentava no amadurecimento do regime de concessão
adotado em 1997.
A experiência internacional mostra que instabilidade
regulatória retrai investidores simplesmente por aumentar a
percepção de risco institucional. Ao longo da
história, diversos movimentos de
desestabilização regulatória já foram
vivenciados em diversas geografias, e operadores avaliam com
cautela redobrada possíveis mudanças que possam
comprometer o retorno de eventuais investimentos.
Passa a ser crítico, portanto, que os detalhes dessa nova
proposta sejam instituídos de forma a preservar e garantir a
estabilidade institucional e atratividade financeira
necessárias para induzir os investimentos privados. Em
termos práticos, o novo regime deve equacionar diversos
pontos, entre os quais:
Estabelecer processo licitatório claro e transparente,
incluindo regras de participação da Petrobras, da
"Petrosal" e critérios de escolha dos investidores privados.
A transparência do processo é um mérito
particular do regime de concessão vigente, e deve ser
preservada;
Definir claramente a mecânica de cálculo do
"cost-oil" e "profit-oil" (petróleo-custo e
petróleo-lucro), bem como os processos que irão
governar o novo mecanismo de partilha, minimizando margens para
interpretações dúbias ou
não-conformidades futuras;
Instituir regras e um modelo de governança que permitam a
aplicação do "carregamento" da parcela de
investimentos do Estado pelos agentes privados: nesse particular,
é imperativo que o contratado consiga delimitar os riscos
associados aos investimentos de desenvolvimento; o caso iraniano,
por exemplo, exigia um orçamento prévio fixo de
desenvolvimento e passava todo o risco do investimento ao
contratado, o que se mostrou altamente prejudicial às
operadoras e retraiu a participação privada em novos
investimentos no País;
Regrar mecanismos de reembolso dos investimentos de
exploração e desenvolvimento de forma acelerada,
permitindo maior atratividade, como em Angola, Rússia e
outros países;
Definir como os casos de unitização de
depósitos em áreas adjacentes sob dois regimes
distintos serão conduzidos. Esse aspecto é
preocupante, pois concessionários em áreas já
concedidas poderão ser prejudicados;
Regulamentar papéis e responsabilidades da "Petrosal" de
forma a delimitar, de forma clara, os direitos de
atuação da estatal sobre a atividade futura de
exploração e produção.
Embora essa não seja uma lista exaustiva, e vários
outros pontos devam emergir ao longo do amadurecimento das
discussões, todas elas deverão convergir para atingir
os objetivos de aumento de participação do Estado,
mas ao mesmo tempo acomodar interesses privados. Afinal, um
investidor acostumado a atuar no setor de exploração
e produção de hidrocarbonetos precisa ser capaz de
ver o retorno dos investimentos com riscos calculados e restritos a
aspectos de mercado, operacionais e financeiros
controláveis, além dos riscos exploratórios.
Se o regime jurídico-regulatório instituído
para o pré-sal garantir essas condições, os
investimentos privados aparecerão, garantindo o
financiamento necessário para materializar a riqueza das
reservas.