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A expansão do comércio internacional brasileiro nas duas últimas décadas foi de mais de 10% ao ano. Em 2014, no entanto, houve queda de 7%. A economia brasileira nitidamente empacou: em 2014, o PIB avançou apenas 0,1%, e colocá-la de volta nos trilhos não será fácil. Eliminar parte dos obstáculos que inibem a atividade exportadora em setores com o maior potencial para avanços seria um bom começo. Foi o que argumentamos em um recente relatório sobre o tema, "Enabling Trade in Brazil".
Aumentar as exportações é, há muito, um desafio para o Brasil. Mesmo durante as décadas de expansão de mais de dois dígitos, quase metade dos ganhos veio da alta dos preços de bens exportados, não do aumento do volume de mercadorias.
Para melhorar a situação, uma medida seria reduzir o custo de exportar. Em 2014, o custo médio para despachar um contêiner do Brasil era de mais de 2.300 dólares. É 21% a mais do que o custo de despachar carga semelhante no sul da Ásia e 5,5% a mais do que na África subsaariana. O Brasil pode aumentar sua participação em cadeias de valor globais se reduzir esse e outros entraves ao comércio exterior - simplificando, por exemplo, processos burocráticos que dificultam o fluxo de mercadorias. Se apenas dois grandes componentes da cadeia de suprimento - a administração aduaneira e a infraestrutura de transportes e comunicações - tivessem uma eficácia equivalente à metade da dos melhores exemplos do mundo, 84 bilhões de dólares poderiam ser somados à economia brasileira.
Diante da complexidade da indústria e de questões ligadas ao comércio, o melhor para o Brasil seria adotar uma abordagem "horizontal" de estímulo às exportações. Isso significa identificar setores com o maior potencial de competitividade e conduzir uma análise exaustiva da cadeia de valor dessas atividades para identificar barreiras comerciais a serem abordadas para que o setor atinja um "ponto de inflexão" no qual se tornaria competitivo, viabilizando o fluxo de mercadorias. Quando melhorou a ligação terrestre entre Nairóbi e Mombaça e ampliou o porto nesta última, o governo do Quênia estimulou investimentos privados de exportadores e transportadoras, algo muito necessário. Investimentos em contêineres refrigerados e caminhões cobertos, juntamente com o apoio a pequenos agricultores para a obtenção de certificados de exportação, permitiram ao Quênia atingir um ponto de inflexão no qual passou a ser rentável para produtores locais de abacate buscarem novos mercados na Europa para seu produto. A medida ajudou o Quênia a triplicar as exportações de abacate.
No Brasil, onde a cadeia de suprimento convive com inúmeras barreiras, o primeiro passo para melhorar as exportações seria entender exatamente que setores possuem maior potencial de avanço e que obstáculos da cadeia de suprimento deveriam ser priorizados para liberar esse potencial. Agrupamos as principais barreiras para o comércio exterior em quatro categorias: acesso ao mercado, administração aduaneira, infraestrutura e ambiente de negócios.
A indústria automotiva brasileira poderia economizar 110 milhões de dólares do custo de importação de componentes utilizados no processo de fabricação de automóveis se atingisse referenciais internacionais de custo. A redução dos custos de importação tornaria a produção brasileira de veículos para exportação mais competitiva, já que parte dos componentes importados vai parar em veículos exportados. Embora a atividade de reexportação goze de isenções fiscais, obter tal benefício é um processo complexo, repleto de controles, que exige de empresas um sem-fim de informações.
Outra medida que contribuiria para o aumento das exportações do setor automotivo seria simplificar e agilizar a burocracia da importação - o que permitiria a montadoras operar com níveis menores de estoques. O Brasil poderia melhorar sua competitividade se investisse de forma mais agressiva em novos terminais portuários que agilizassem e barateassem as exportações. Apesar de certos avanços na qualidade dos serviços, os custos logísticos no país são altos na comparação com os de muitos outros países. Ou seja, o Brasil sairia ganhando se fechasse mais acordos bilaterais com outros países para a exportação de veículos produzidos no país.
Os mesmos obstáculos que inibem as exportações da indústria automotiva brasileira também limitam a expansão em outros setores. O Brasil é o segundo maior exportador de soja do mundo, e tem potencial para exportar ainda mais. Para tanto, teria de eliminar gargalos no transporte interno que tornam certas regiões produtoras de soja no Brasil menos competitivas do que nos Estados Unidos. Poderíamos, é claro, citar outros setores importantes que deveriam estar entre as prioridades do país - como equipamentos de transporte e maquinário, mas a lista não terminaria aí. O Brasil está crescendo a um ritmo inferior à média mundial. Essa situação vai começar a mudar quando o país fechar o foco em setores com o maior potencial de crescimento através da eliminação de barreiras comerciais. O país poderia, então, aplicar uma abordagem sistemática à remoção desses obstáculos - abordagem em sintonia com a estratégia atual de crescimento e as políticas de ajuste fiscal.
Num país do porte do Brasil, o meio mais eficiente e eficaz de incentivar as exportações será identificar barreiras comerciais em toda a cadeia de valor dos setores mais importantes e, em seguida, buscar eliminá-las para tornar o setor competitivo. Avanços registrados nesses setores vão preparar o terreno para avanços em outras indústrias.
Fernando Martins é sócio sênior da Bain & Company em São Paulo. Wolfgang Lehmacher é diretor da área de cadeia de suprimento e transportes no Fórum Econômico Mundial, em Nova York.