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ESSA NÃO É EXATAMENTE UMA ERA DE ABUNDÂNCIA na economia brasileira. Um levantamento da consultoria Economática mostra que o lucro das empresas abertas brasileiras caiu 47% em relação ao mesmo período do ano passado. Isso mesmo: é quase metade. Diante de uma queda dessas proporções, empresários e executivos são colocados naquela situação desagradável (pelo menos para os não sádicos) e que surge sempre que o ciclo econômico embica para baixo: o jeito, para evitar vexame, é cortar custos. Mais da metade das empresas cujas ações compõem o índice Bovespa anunciou, em agosto, que passará o facão em suas operações. Alguns poderão dizer que essa é a natureza do negócio; quando tudo vai bem, é hora de contratar, investir, pensar grande. Quando as coisas vão mal, é hora de demitir, cortar, contar os centavos. Os problemas desse modo de pensar são dois. E na hora do otimismo que se cometem as maiores burradas. Segundo, e urgente para os tempos atuais: quando a conta da burrada vem e as empresas partem para o corte de custos, elas freqüentemente fazem tudo errado.
Um estudo recém-concluído pela consultoria Bain&Company mostra que as empresas insistem no corte burro de custos, aquele que sacrifica o desempenho no médio prazo ou tem caráter meramente emergencial e a companhia, após alguns meses de silhueta afinada, volta a ganhar gorduras indesejadas assim que o pior passa. "As ações mais óbvias, como demitir funcionários, não se sustentam no longo prazo. Quando a economia virar, a empresa vai pagar mais caro para contratar ou vai ficar para trás por não ter gente suficiente para crescer", diz Alfredo Pinto, sócio da Bain e coordenador do estudo. A consultoria mapeou iniciativas de enxugamento realizadas em 300 empresas na crise de 2008 e 2009 e descobriu que 40% das que conseguiram cortar 10% dos custos já retornaram ao patamar anterior de gastos. E, entre as que emagreceram 20%, 60% engordaram tudo de volta.
A principal lição que fica: cortar custos no desespero da crise é um perigo porque as empresas tendem a olhar, de maneira especialmente nociva, para o curto prazo o que até ajuda a cumprir uma meta ou outra, mas não mexe na estrutura de custos de maneira permanente. Encontrar pequenas fontes de desperdício é um dos principais desafios na hora de montar programas de corte de custos. São detalhes que, geralmente, não são percebidos pelos altos executivos. Para eles, a grande tentação é definir cortes-padrão para todas as áreas algo como obrigar todo mundo a diminuir os gastos em 10%. Mas essas decisões mágicas só costumam trazer insatisfação. A curitibana Positivo Informática tinha tudo para tomar decisões radicais desse tipo.
Assolada pela competição com as fabricantes de computador asiáticas, a empresa vive uma constante pressão para baixar seus preços. A única forma de resistir é baixando também os custos. "Chegamos ao ponto de medir quantos apertos de parafuso poderíamos reduzir. Estamos fabricando 200 000 computadores por mês e pequenas mudanças podem trazer grande economia", diz Ricardo Fernandes, vice-presidente financeiro da Positivo. Mas, em vez de definir metas para todas as áreas, a empresa decidiu economizar na gestão de estoques, deixando departamentos tidos como estratégicos intocados. Nos últimos dois anos, o estoque caiu de 600 milhões para os atuais 450 milhões, liberando dinheiro para investir em notebooks, mercado que se tornou o mais importante para a Positivo.
De acordo com o estudo da Bain, os projetos de corte mais bem-sucedidos são os que envolvem os funcionários e os fornecedores que percebem as oportunidades de corte na prática. Foi o que fez a fabricante de alumínio Albras. Em março, a empresa convocou todos os funcionários a dar sugestões de melhorias em suas áreas. Chegaram mais de 1200 idéias, que trarão 79 milhões de reais de economia. Algumas já foram aplicadas. A simples troca de máscaras de segurança descartáveis por modelos que exigem apenas a substituição do filtro resultará numa economia de 450 000 reais no ano. "Parece uma ação óbvia, mas os gestores não conseguem enxergar tudo sozinhos", diz Luis Jorge Nunes, presidente da Albras.
BAIXO CUSTO
Pensar em custos o tempo inteiro e não só quando o lucro cai pela metade num trimestre é a chave para o sucesso das empresas, e isso na visão de seus próprios presidentes. De acordo com a Bain&Company, 40% dos executivos de companhias que são líderes em seus mercados consideram o baixo custo seu principal diferencial mais do que estratégia, marcas ou nível de tecnologia. Essa turma costuma definir um intervalo de tolerância a gastos. A construtora mineira Direcional, que tem a segunda maior rentabilidade do setor, criou um departamento para monitorar as despesas de seus 40 projetos. A equipe é formada por 20 engenheiros que passam uma semana por mês em cada obra para uma auditoria detalhada. Depois que o departamento foi criado, os acréscimos de orçamento caíram de 8% para 4%. A Direcional faturou 650 milhões de reais no primeiro semestre, uma expansão de 36% em relação ao mesmo período de 2011. Na fabricante de chocolates Cacau Show, que tem 1200 franquias no país, o fundador, Alexandre Costa, coordena as reuniões de diretoria comum facão usado na colheita do cacau instalado no centro da mesa. Ele está ali para lembrar aos diretores que, se o preço do bombom aumentar 1 centavo, a Cacau Show corre o risco de perder milhares de clientes. O facão, portanto, tem de cortar custos mesmo quando as coisas vão às mil maravilhas. E um jeito pouco convencional de colocar em prática uma filosofia muito falada, pouco executada: mais importante do que cortar os custos é não permitir que eles cresçam.