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Pré-sal vai aumentar importância de São Paulo e das empresas chinesas na exploração e produção nacional de petróleo.
O pré-sal poderá posicionar o Brasil como um dos maiores exportadores de petróleo do mundo, com um excedente que pode superar 1,5 milhão de barris por dia, em um momento em que a demanda pelo insumo não será mais liderada pelos EUA, mas pela Ásia.
Essa nova fronteira de exploração também vai mudar o ranking das áreas produtoras de óleo no país, reduzindo a participação da Bacia de Campos e do Rio de Janeiro. Além disso, deverá promover debates sobre o destino dessa produção e ampliar a presença da China no mercado de energia do Brasil.
Há 20 anos, mais de 85% da produção de petróleo no Brasil vinham de poços na Bacia de Campos. Em junho, eram 75%, enquanto a Bacia de Santos já respondia hoje por 15%. São Paulo responde por 8% da oferta de óleo e 14% do gás doméstico. Em relação à produção por operador, 90% do petróleo vêm de poços da Petrobras, enquanto Shell e Statoil respondem, respectivamente, por 3,9% e 3,3%, segundo dados de junho da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Com a exploração gradual do pré-sal, a Bacia de Santos e o Estado de São Paulo devem aumentar sua presença na exploração e produção, enquanto operadoras como a Shell, a francesa Total e as estatais chinesas CNPC e CNOOC, que venceram com a Petrobras a licitação do megacampo de Libra no ano passado, devem reforçar sua presença em território brasileiro.
Segundo José de Sá, sócio da Bain & Co, os resultados da campanha exploratória serão acompanhados de perto pelas empresas em todo o mundo, para avaliar os custos e os prazos do projeto. Nos últimos anos, muitos têm sofrido com atrasos e alta de preços, o que tem prejudicado o balanço de algumas petroleiras.
Para a Petrobras, o desafio não é pequeno. A empresa prevê chegar ao início da próxima década com uma produção de quatro milhões de barris por dia, o dobro do que extrai hoje. Ou seja, a estatal, que levou 60 anos para chegar à marca de dois milhões de barris por dia, pretende dobrar esse patamar em apenas sete anos. O présal, que responde por 22% do total da produção atual da empresa, responderá em 2018 por 52% do total. Serão 19 novas unidades de produção instaladas na Bacia de Santos até o fim daquele ano. Com esses projetos, a expectativa é de que a produção de petróleo exclusivamente nas áreas do présal, em 2017, ultrapasse a barreira de um milhão de barris por dia. Entre 2014 e 2018, a estatal prevê investir US$ 220 bilhões, o maior programa de investimento de uma petroleira no mundo.
Em 13 de julho, a produção da camada pré-sal das bacias de Santos e Campos atingiu a marca de 546 mil barris diários, um novo recorde. A produtividade média por poço em operação comercial no polo da Bacia de Santos tem sido de 25 mil barris de petróleo por dia, maior que a registrada no Mar do Norte (15 mil barris de petróleo por poço/dia) e no Golfo do México (10 mil barris de petróleo por poço/dia). "Nossas reservas têm o diferencial de estar próximas ao maior mercado consumidor de energia do país, o que resulta em alta competitividade. Em quatro anos, com base em 2010, nossa produção no pré-sal cresceu dez vezes", diz a presidente da estatal, Maria Graça Foster.
Publicado recentemente, relatório da BP aponta que a participação do Brasil no mercado mundial irá crescer até 2035.0 pré-sal se converterá em uma das principais províncias petrolíferas do planeta, o que fará o Brasil se tornar um exportador de energia e o maior produtor do setor na América do Sul. Mais da metade do crescimento da produção de petróleo do mundo até 2035 virá de fontes fora da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), com o aumento da produção de óleo de xisto dos EUA, areias petrolíferas canadenses e águas profundas do Brasil.
A revolução do gás de xisto nos EUA e a urbanização chinesa alteraram a dinâmica da demanda global do mercado de energia. Hoje o país asiático, que produz cerca de quatro milhões de barris por dia, importa outros seis milhões de barris diários e processa dez milhões de barris diários, é o principal comprador de petróleo no mundo. O apetite chinês deve continuar em alta ao longo das próximas duas décadas. A taxa de motorização na maior economia emergente é de 50 veículos por 1000 habitantes, um terço da apurada na Coréia do Sul. Outros fatores impulsionarão a demanda chinesa.
"A matriz energética chinesa é baseada em carvão, transportado por ferrovias, que usam muito diesel; o minério segue em navios, que consomem muito combustível, e o país ainda tem demanda grande de petroquímicos, por conta da construção civil e bens de consumo", diz Alexandre Szldo, professor de planejamento energético da Coppe da UFRJ. Simulações da instituição estimam que o excedente de exportação do Brasil pode ficar entre 1,5 milhão de barris por dia a dois milhões de barris por dia na próxima década, sendo a Ásia o principal mercado comprador.
Simulações realizadas pela instituição ainda apontam que o barril de petróleo do pré-sal tem de estar acima de US$ 80 para permitir a remuneração no parque refinador chinês. "Pode cair abaixo desse preço, mas não é o cenário mais provável, teria de haver uma ampla rearticulação do Iraque, que produzia cinco milhões de barris por dia na década de 1970 e hoje produz pouco menos de dois milhões", destaca.
A participação chinesa no setor de petróleo nacional vem crescendo, segundo estudo dos professores Edmar de Almeida e Helder Consoli, do Instituto de Energia da UFRJ. Em 2010, a China superou os EUA, tornando-se o maior comprador. Enquanto em 2003, o valor das exportações de petróleo do Brasil para a China eram 0,5% do total, em 2013 os embarques saltaram para 8,7%. Apesar disso, o Brasil representa apenas 2% do petróleo importado pelos chineses. Ou seja, ainda há muito espaço para crescer.
Balança comercial do setor apresenta déficits crescentes
O ex-ministro da Fazenda Delfim Netto costuma dizer que o cenário macroeconômico do Brasil ao longo das últimas décadas tem enfrentado dois obstáculos recorrentes: déficits vultosos em transações correntes e escassez de energia. Explorar a camada pré-sal poderá mudar isso, já que o país poderá contar com um excedente de exportação superior a 1,5 milhão de barris por dia a partir da próxima década.
Transformar o futuro em realidade não será tarefa fácil. O principal obstáculo é a política de preços dos derivados de petróleo. O controle sobre os preços dos combustíveis, em especial gasolina e diesel, desde 2008 somou-se à política de incentivo à aquisição de veículos, com redução do Imposto de Produtos Industrializados (IPI). De um lado, se aumentou a frota. De outro, a gasolina teve seu preço subsidiado, o que reduziu a competitividade do setor sucroalcoo- leiro, que pisou no freio.
Entre 2010 e início de 2014, as importações do derivado da gasolina cresceram490%, segundo estimativas de Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). "Hoje 12% da gasolina nacional é importada e 17% do diesel vem de fora e, a se manter essa política, esses números irão aumentar e a participação do etanol cairá ainda mais", observa.
O controle de preços tem impacto direto sobre o caixa da Petrobras. Segundo estimativa de Pires, cerca de 60% do caixa da empresa está diretamente relacionado às vendas de gasolina e diesel.
Sem liberdade para acompanhar os preços internacionais, a estatal enfrenta um cenário que combina investimentos crescentes no pré-sal e alta do endividamento. No balanço do segundo trimestre, a Petrobras atingiu uma relação de dívida líquida e Ebitda de 3,9 vezes e uma relação entre dívida e de capitalização de 40%, acima dos 35% estipulados pelo conselho da petroleira. Para driblar os percalços, a estatal tem trabalhado em aumento da eficiência e venda de algumas operações consideradas não estratégicas.
O governo federal já acenou que poderá reajustar os preços dos derivados para reduzir a defasagem dos preços dos combustíveis no Brasil em relação ao exterior. Seria a primeira vez que isso seria feito em um ano eleitoral desde 2001, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso. "A expectativa é de que possa ser feito em duas etapas, com parcelas de 5% cada", diz o economista Fábio Silveira, da GO Associados.
Para ele, a recuperação da capacidade de investimento da estatal está ligada à resolução da política de preços. "Uma decisão a favor de reajuste leva meses para ser sentida na melhoria da margem e capacidade de investimento da empresa, que tem sido corroída ao longo dos últimos anos", aponta.
O setor tem apresentado déficit na balança comercial. Desde a década de 1980 não se assistiu à construção de nenhuma nova refinaria, tendência apenas revertida na metade da década passada, com o sinal verde dado à construção da Refinaria Abreu Lima (PE) e aos projetos de outras três refinarias. Em 2012, a balança setorial ficou negativa em US$ 13,7 bilhões, segundo dados da GO Associados. Um ano depois, o número piorou: US$ 27,9 bilhões. Para este ano, prevê-se déficit de US$ 22,5 bilhões. (RR)