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Enquanto espera as eleições presidenciais deste ano na Argentina, que permitirão previsões sobre o futuro do país, o governo brasileiro tende a explorar alternativas de estímulo a exportações que não dependam do consenso no Mercosul, de sócios atribulados. O tema da moda, a melhor inclusão do país nas cadeias globais de valor, também deve receber tratamento que não dependa em médio prazo de acordos de livre comércio, o que ressalta a importância, na estratégia oficial, das medidas de facilitação no trânsito de mercadorias.
Também na Organização Mundial de Comércio, o impasse em torno das amplas negociações de abertura comercial levou à chamada agenda de Bali, o acordo firmado no fim de 2013, sob a batuta do diretor-geral da OMC, o brasileiro Roberto Azevedo, que fixou doze medidas para agilizar o movimento, liberação e transporte de mercadorias nas fronteiras. O Brasil tem avançado em boa parte dessas medidas, e ganhou destaque em dois estudos divulgados há poucos dias, no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça.
Os estudos foram produzidos pelo Fórum, em colaboração com a consultoria Bain & Company e o International Trade Center, e um deles (is.gd/w2mEGa) trata exclusivamente do caso brasileiro, com a criação do Portal Único que concentrará, por meio eletrônico, a burocracia das agências como a Receita Federal, a Anvisa e outros órgãos de fiscalização que controlam a exportação e importação no país. "Um passo arrojado, na direção correta; um começo decisivo, bem focalizado", avalia o relatório, sobre o Portal Único brasileiro.
País ganhou destaque em dois estudos em Davos
A experiência do Brasil é modelar por sua abordagem "agressiva" dos problemas, com apoio presidencial, cronogramas de longo prazo e participação ativa do setor privado, o que faz do programa um objetivo de Estado, não só de governo, avaliam os especialistas que atuaram para o Fórum Econômico Mundial.
O estudo cita avaliação da Fundação Getulio Vargas, de que o Portal Único - com metas de redução dos prazos de liberação de mercadorias de 13 para 8 dias no caso das exportações e de 17 para 10 dias, nas importações - cria para os exportadores uma economia de US$ 1,5 bilhão anual e pode aumentar em 1,52% o Produto Interno Bruto do país, em 2017, quando estiver totalmente em ação. "A avaliação de US$ 1,5 bilhão é bem conservadora; somadas outras variáveis, além do efeito direto do portal, os ganhos podem ser bem maiores", comentou ao Valor o sócio da Bain&Company Fernando Martins.
Desde 2013 o Fórum Econômico Mundial põe em primeiro plano a discussão sobre integração de cadeias globais de valor e defende as chamadas medidas de facilitação de comércio, transformadas em agenda mundial na reunião de Bali. Os estudos reafirmam que seria possível economizar US$ 77 bilhões anuais em custos de comércio com a remoção de barreiras equivalentes a metade do que há em Cingapura, o país mais bem-sucedido em matéria de eficiência no manejo do comércio exterior.
"O potencial de aumento de exportações no Brasil é bem maior que países como o México, que trabalha fortemente há anos na facilitação do comércio", diz Martins. "Hoje, o Brasil está nas pontas das cadeias de valor, com bens primários ou alguns bens finais; a burocracia governamental é um dos obstáculos para atrair outras partes da cadeia ao país".
As medidas da facilitação são parte importante do plano de estímulos a exportações que o ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, divulga no fim deste mês, para discussão com o setor privado. "Gastamos meses com o mapeamento do que seria necessário para o Portal Único, seguimos todos os pontos relevantes apontados no relatório do Fórum Mundial", disse ao Valor o secretário de Comércio Exterior, Daniel Godinho, que destaca o envolvimento do setor privado nas discussões.
Entre os primeiros resultados do novo mecanismo está a informatização de processos de drawback, a importação de mercadorias para transformação no país e reexportação, antes submetida a processos em papel no Banco do Brasil e hoje informatizado, com acesso mais fácil aos interessados. O Portal, no estado em que está, não exige grandes investimentos e pode trazer resultados sensíveis sem gastos orçamentários adicionais, defende Godinho.
Uma vantagem não alardeada pelo governo é a porta aberta ao Brasil pelas medidas de facilitação de comércio, para aumentar as transações comerciais com outros países sem necessidade da custosa negociação dentro do Mercosul. Um acordo de certificação e reconhecimento mútuos com os EUA ou União Europeia pode trazer crescimento imediato nas exportações antes de qualquer acordo tradicional de redução de tarifas de importação, como constataram os especialistas do Fórum Econômico Mundial e da Bain&Company.
Na avaliação do Fórum, acordos de facilitação têm potencial de aumentar em 4,7% o PIB mundial e em 14,5% as exportações, enquanto a redução global das tarifas a zero aumentaria o PIB em 0,7% e as exportações, em 10%.
A facilitação de comércio não terá exclusividade nas estratégias do governo. Godinho afirma que o plano de exportações não deixará de lado os esforços de negociação de acordos, ao lado do Mercosul. Martins lembra que, além de uma série de problemas ainda apontados pelo setor privado a resolver na área de facilitação de comércio, há outros fatores que terão de ser enfrentados simultaneamente pelo país, como o custo da energia, a carga de impostos e a carência de infraestrutura.
Atacar esses problemas é fundamental para que o Brasil atinja o que chama de "tipping point", o balanço de custos que estimula as empresas, especialmente pequenas e médias, a fazer do país uma base de operações e de exportação, lembra ele. São pontos que terão de constar do esperado plano de exportações do governo.